1
A música deles começou a tocar, e ela acendeu mais um cigarro. A cidade lá fora gemia, agonizava. Não havia estrelas no céu, nem mesmo lua. Só se via a luz fria dos postes, das casas, dos prédios e dos carros. De repente, um vaga-lume adentra o quarto escuro e ilumina o porta-retrato. Ela olha, com olhos úmidos e escorridos, levanta-se da cama e registra a cena com sua polaróide. Sua cabeça doía quando chorava e, quando olhava para a luz, sentia que ia explodir. A luminosidade vinda daquele vaga-lume estava incomodando-a. Num rápido momento de insanidade, pegou a toalha que estava sobre a cadeira e matou-o. De volta à escuridão do quarto.
2
O sangue escorria vagarosamente pelo dedo indicador. Ele tentou, mas nunca teve talento na cozinha. Pecava pelo excesso de cuidado, dizia. No banheiro, estancou o sangue com a toalha de rosto, por falta de coisa melhor para servir de gaze. Sentiu o cheiro dela. Lembrou-se que ela costumava usar aquela toalha para secar os cabelos. Aproximou-a do nariz, respirou fundo e deixou que as lágrimas molhassem-na. Voltou pra cozinha satisfeito por ter lembrado do cheiro, do gosto e do calor que ela tinha.
3
Acordou com a luz do sol em seu rosto. O vaga-lume ainda estava ali, estirado no chão. Recolheu-o e jogou-o pela janela mesmo. O dia estava como de costume: ensolarado, pateticamente ensolarado. Enrolou-se no edredom e ficou andando pela casa dessa forma, ouvindo Dylan, fumando um cigarro atrás do outro, bebendo o resto de conhaque da garrafa. As pálpebras estavam ficando cada vez mais pesadas, deixou que cerrassem seus olhos e mostrassem a ela a bagunça que estava sua cabeça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário